Los tonos mayores (Ingrid Pokropek, 2023)

Este artigo foi escrito e publicado [em inglês] durante o programa Talent Press no Festival de Berlim, em fevereiro de 2024.

De certa forma, Los Tonos Mayores (2023) funciona como um estudo semiótico, mas conduzido por uma adolescente. O primeiro filme de longa-metragem de Ingrid Pokropek, parte do programa Generation Kplus do Berlinale, começa com Ana (Sofía Clausen) sentindo essa estranha frequência vinda da placa de metal que tem dentro do braço e repetindo os tons para sua amiga Lepa (Lina Ziccarello), que os transforma em música em seu teclado. Ana mora com seu pai (Pablo Seijo) nos arredores de Buenos Aires; sua mãe faleceu. O filme trata de explorar sinais ocultos, sejam as misteriosas vibrações vindas de dentro do braço da protagonista, ou os tipos mais terrenos de descobertas que ela experimenta como uma adolescente de quatorze anos.

Enquanto o pai de Ana começa a sair com uma ex-namorada sua, Lepa logo se envolve em seus primeiros relacionamentos românticos com um rapaz, ambos eventos que parecem afetar um pouco a protagonista. Ela ainda está muito envolvida nos quebra-cabeças lúdicos trazidos por sua placa de metal, que logo descobre ser pequena demais e terá que ser removida, quase como se fosse forçada a crescer.

Os sinais, que são primariamente traduzidos como zumbidos e música, ganham uma nova interpretação quando Ana conhece um jovem soldado (Santiago Ferreira), que os lê como código Morse. A partir de sequências de pontos e espaços, ele pode traduzi-los em palavras. Um novo gênero de perguntas surge ao interpretar o significado dessas palavras: elas indicam pontos de encontro? Coordenadas? Constelações? De quem são? Espiões? Aliens? Amantes? Poderiam ser mensagens do além? Quando uma das sequências de códigos diz “não me esqueça”, Ana se pergunta se poderia ser uma mensagem de sua mãe.

A beleza de Los tonos mayores está justamente nessas perguntas, que parecem se abrir cada vez mais, nunca se fixando em uma única resposta, mas também nunca se afastando muito da realidade. Por mais cheios de admiração que esses sinais sejam, as andanças de Ana pela cidade são muito mundanas. Essas muitas aberturas estão sempre muito ligadas à perspectiva e ao ambiente da protagonista; ela busca significados dentro de sua própria cidade a partir de palavras escritas em seu próprio idioma. Afinal, não devemos esquecer, essas mensagens vêm de dentro de seu próprio corpo. Esse movimento de dentro para fora também é refletido na trilha sonora do filme, composta por Gabriel Chwojnik, onde sons de ficção científica assustadores se transformam em notas mais emotivas; como uma aventura infantil, soam ao mesmo tempo misteriosos e nostálgicos.

As próprias mensagens são invisíveis, e o filme se concentra em encontrar o máximo de manifestações físicas e imaginárias delas quanto possível: desde o sonho de Ana onde as luzes de seu bairro continuam piscando ligadas e desligadas, até os diferentes locais na cidade que ela encontra através das palavras traduzidas pelo código Morse. Uma estátua de touro, um cinema, um café, um restaurante à beira do cais. Esses lugares aparentemente aleatórios por toda Buenos Aires, tornados importantes pelo contexto da história, também funcionam como uma espécie de coleção de lugares peculiares na cidade.

É nesse ponto que percebemos que a jornada de Ana compartilha muitas semelhanças com o processo criativo de um filme; o que estamos vendo na tela também é uma combinação de cenários e pessoas inicialmente arbitrárias, reunidas para fazer sentido por este tecido de ficção. Apesar da quantidade de significados sugeridos, ou até mesmo por causa disso, o tecido de Los tonos mayores é muito leve; há tantos significados atribuídos a esses sinais que percebemos mais claramente sua arbitrariedade. Em outras palavras, podemos ver a estátua do touro como um sinal nas mensagens de Ana ou apenas uma estátua de touro curiosa. É dessa maneira que o filme de Pokropek consegue ter o mesmo tipo de espírito aventureiro que sua protagonista, seguindo os sinais e vendo para onde eles nos levam.

Paula Mermelstein Costa